segunda-feira, 18 de março de 2013

Feito canção francesa


Me renovo ao adentrar o recanto das auroras celestiais. Desperto com o canto do vento que abre a janela e ultrapassa as cortinas até chegar ao meu ouvido. Suave como um beijo da pessoa amada.
Dei minha mão pra cigana ler. Ela me disse que as palavras estavam ali, mas não faziam sentido. Não sabia o meu destino e eu agradeci. Dei-lhe um abraço e ela rejeitou meu dinheiro. "Guarde-o e volte quando conseguir sorrir".
Aproveitei meu nada saber e brinquei de ser criança. Dancei na chuva sem medo de ficar gripada, olhei pro céu e cantei sussurros de amor pras gotas d'água. Quase fui até tua casa te chamar, mas lembrei que não é feriado e que você pediu pra eu me afastar. Não lembro bem o motivo, e já não faz diferença.
O circo veio pra cidade e eu vou te levar lá. Deixa chegar o fim de semana, sei que você odeia os sábados e dorme o domingo inteiro. Odeio palhaço mas você acha graça, então vale o esforço se teus olhos vão sorrir.
Vou pedir pra tua mãe não avisar, vou levar café da manhã bem cedinho no teu quarto. Chá verde, suco de laranja, café sem açúcar e bolo de cenoura. A gente almoça pizza e come pipoca doce, como fazíamos antes. Não tô pedindo beijo, quero só teu afago no cabelo.
Quando a tarde chegar e o roxo colorir tua fotografia, você vai lembrar a razão que um dia te fez me amar.

domingo, 17 de março de 2013

De malas prontas no meio-fio


Sou uma contradição que o destino colocou na tua calçada, com fumaça transbordando pelo peito. Pedi abrigo e tu hesitou, certa de que não aguentaria tal fardo. Depois de considerar, acreditou que eu pudesse ser teu mais nobre ato, tua redenção. Quão ridícula se sente agora? 
Trago tristeza nos olhos. Tentaste me salvar da melancolia sem entender que é meu próprio ser. Respiro dias nublados, sobrevivo com falência múltipla dos sentidos. 
Sinto teu cinismo ancorando sem pedir licença. Bagunça meu cabelo e minha psique, só não faz estrago no meu coração. Ele é muito sábio pra se deixar abater. Pode ser que eu não tenha me adaptado à paisagem que me faz cenário. Meu corpo aqui, a mente lá. Vagando por um lugar que não habitei, mas que vivi. Faz sentido? É claro que não, tu não entende de sonhar.
Teu bom senso é preocupante, só quer saber de fatos e não encara o mundo com sorriso no olhar. Palavras pensadas, atitudes calculadas por anos. Qual o problema em se deixar levar? O rio de mágoas tem correnteza, se teu barco não furar pode ser que ela te leve até tua morada. Tu poderá me encontrar por lá, chorando de alegria por te ver, ou sorrindo de solidão latente.
Tentei te mostrar a beleza das árvores sem folhas, do sopro gelado que a madrugada às vezes dá, e tu só fez se cobrir com o edredom. Implorei por companhia, mas não consegui atracar no teu cais. 
Minha presença não faz diferença na tua agenda lotada. Não tenho apreço então te peço: vê se te lembra de mim.

sexta-feira, 15 de março de 2013

Sobre as cicatrizes no braço esquerdo

Sou fruto de um erro que você cometeu aos vinte e quatro e carrega por longos dezenove anos. Desculpe a estadia, sei que sou hóspede e gasto mais do que lhe dou em troca.
Te escrevo na esperança de que num surto você leia. Besteira, a novela é muito mais interessante que as linhas do meu caderno. Teus olhos não desgrudam da tevê, mesmo que minhas palavras batam em teus ouvidos insistentemente. Mas você não precisa me ouvir, tem problemas demais e eu sou a maior causa deles. Não, você não precisa me ouvir, sou complicada demais. Triste demais e nem tenho razão pra ser assim. Você nunca notou, nunca olhou pra mim. Deixa pra lá, o psicólogo resolve.
Sou diferente demais, só uma criança buscando por atenção. Quero te contrariar, te irritar, ouvir o quanto me odeia. Todos os dias, mais de uma vez. Você se arrependeu, eu entendo. Perdoe-me por não ter sido uma boa filha.
Se minhas risadas te entristecem, não tenho motivo pra olhar pra trás.

terça-feira, 12 de março de 2013

Vai ser melhor quando te conhecer

Milhas de incerteza permeiam meu coração. Um punhado de tristeza e insegurança, é isso que tanto se busca? O que vendem na tevê não é amor, é propaganda para que mais remédios contra depressão sejam vendidos.
Eu era totalmente cética até você cruzar a sala e me alcançar o olhar. Tua boca de sorriso inteiro, sem migalhas de solidão. Ao te observar, me senti viva pela primeira vez. Me tornei sua.
Sem notar, construiu uma fortaleza impenetrável barrando minha entrada. Eu, que só queria enrolar teu cabelo nos dedos. Me amarga o gosto saber que nossos lábios não terão o encontro perfeito.
Não me importaria em passar horas numa palestra sobre cálculos se teu braço estivesse na cadeira ao lado, esbarrando de leve no meu.